Jornalista, amante do samba e da cultura boemia. Safra de 1977. Cultivado nas montanhas do sul de Minas. Envelhecido em tonéis de umburana em redações pelo Brasil afora.
Fiz esse texto para o trabalho de conclusão do curso de Jornalismo do Fabinho Serapião, que está produzindo um site para o Meu Kantinho Centro de Cultura (o site atual ainda está no ar, quando o novo entrar, atualizo aqui). Como fui eu que o levei até lá pela primeira vez, ele me pediu uma colaboração para o memorável projeto. Como já está feito, compartilho aqui com vocês.
Já tem algum tempo que me dedico, com prazer, a estudar o samba. Falar de samba é falar das próprias raízes brasileiras. Da sua formação, de seu povo, de sua verdadeira história. E também da sua desigualdade, do ranço preconceituoso e da ganância que, infelizmente, ainda emana de boa parte de uma elite que tende sempre a ignorar a beleza e a sabedoria que brota na simplicidade.
Foi por intermédio do amigo compositor João do Violão que conheci o Meu Kantinho Centro de Cultura. Lá, onde se canta samba o ano inteiro, conheci Clóves do Violão, Sivuca, ‘capitão’ Armando, Victor Baptista, Bárbara (e seu delicioso feijão preto), entre tantos outros. Lá fiz amigos e descobri nas sete cordas do americano e mangueirense fanático Clóves - fundador do projeto - que o samba tem, sobretudo, alma.
Desde os tempos de Tia Ciata, que acolhia os criminosos tocadores de tambor e violão perseguidos pelos capitães de mato (que, na época, já estavam devidamente fardados), à dedicação de Clóves para manter o sorriso no rosto das crianças da Penha, na boemia zona norte carioca, o samba é sinônimo de subversão.
Subversão no seu sentido mais puro. Da dissidência de um uma realidade imposta por poucos que têm uma falsa pretensão de superioridade sobre muitos que, simplesmente, não têm oportunidade de mostrar o que, realmente, é bom, belo e verdadeiro.
Clóves e o, hoje, ‘Nosso’ Kantinho – pois, assim como todos que ali já estiveram, me considero um pouco responsável por aquele lugar – iniciou uma revolução, que hoje é levada com maestria pela filha Alessandra e pelos amigos que ali ficaram. A revolução do sorriso das crianças da Penha, que aprenderam nas sete notas ensinadas pelo mestre a levarem a vida no compasso que a vida lhes dá.
Ao Clóves, que hoje participa de rodas em outra dimensão, agradeço por mostrar a mim – e a tantos outros – aquilo que Noel já havia dito. Que o samba não vem do morro, nem da cidade, e sim nasce no coração. A ele, meu samba em feitio de oração...
Legendas e créditos:
- Eu no Meu Kantinho com os bambas Sivuca (D) e 'capitão' Armando. Arquivo Pessoal. - Vídeo em comemoração aos 10 anos do Meu Kantinho Centro de Cultura e homenagem à Clóves do Violã. No Youtube.
- João do Violão no Meu Kantinho cantando: "De manhã quando eu desço a ladeira.. a nega pensa que eu vou trabalhar". No Youtube.
domingo, 30 de agosto de 2009
Bom... faz tempo que não venho aqui. Já é quase segunda-feira (31), mas ainda estou no domingo. Recém chegado de um banho de brasilidade com as tias baianas das escolas de samba de São Paulo e o pessoal do Kolombolo - além das companhias super especiais que tenho nestes momentos de colorir a mente e o corpo para enfrentar o cinza do cotidiano.
Acredito que hoje já fiz minha parte. A de viver o meu dia. De forma justa, sincera e honesta. O que não é difícil.
Até mesmo ja escrevi o texto. E, por isto mesmo, resolvi postar no já esquecido blog. E não fujo à regra. O assunto é política. E, em muito tempo, algo que me fez sentir de novo emoção com ela - embora possa parecer (e, até ser) uma nova enrascada.
Enfim, só entrei aqui pra postar o texto que escrevi - tecnicamente chato e que não foi publicado (mais um pra coleção) - sobre o ato de filiação de Marina Silva ao PV. Não. Eu não acredito em PV, como sempre desconfiei de PT (a não ser o de Plínio Teodoro, a sigla). Mas, sim, acredito - ainda - no ser humano. Eis abaixo:
O ato de filiação da ex-ministra do Meio Ambiente, senadora Marina Silva, ao Partido Verde selou definitivamente a mudança prevista para a sucessão presidencial de Lula em 2010. Sob um coro de "Brasil urgente, Marina presidente", a ex-petista assinou a filiação ao PV e, emocionada, lembrou sua trajetória política de 30 anos no Partido dos Trabalhadores. "Não foi fácil viver os últimos dias que vivi", afirmou a senadora sobre a difícil decisão de deixar o PT.
Em seu discurso, Marina afirmou que não está "rompendo com a herança boa do passado, nem com os erros que cometemos, tudo que fizemos juntos deve ser preservado". Ela ressaltou a afinidade entre a antiga e a nova legenda, dizendo que a filiação ao PV - com vistas às eleições presidenciais 2010 - "nao é para fazer um novo caminho, mas uma nova maneira de caminhar".
Marina disse ainda que sempre recebeu o apoio dos companheiros petistas em conversas antes de deixar o partido. "Ouvia das pessoas: porque você não permanece e vamos fazer este debate (sobre a sustentabilidade estratégica) dentro do PT? Mas não se tratava de convencer sobre o que o mundo inteiro já está convencido, tratava-se de fazer um encontro com aqueles que ja estão convencidos e de fazer o convencimento de outras pessoas, inclusive em outros partidos, no PT, PSDB, PCdoB, em todos os partidos que não podem se furtar deste desafio".
Com uma frase do escritor Guimarães Rosa - "será que você seria capaz de se esquecer de mim e, assim mesmo, depois, continuar gostando. Como é que a gente sabe?" -, a senadora homenageou os colegas petistas dizendo que vai " continuar gostando e gostando sem querer, sem saber, de todas as pessoas que construiram esta historia".
Para celebrar a filiação aos verdes, Marina usou nova frase, desta vez do filósofo católico Santo Agostinho, a quem atribui sua formação ética. "Tarde vos amei, beleza tão antiga e tão nova, tarde vos amei. É que estava dentro de mim e eu estava fora de mim", discursou, referindo-se à sua eterna causa de luta em favor do meio ambiente.
Salada ideológica As mais de mil pessoas, segundo a organização do evento, que lotaram uma luxuosa casa de eventos em região nobre da capital paulista para acompanhar a filiação de Marina Silva ao PV formaram uma verdadeira "salada ideológica". Entre artistas, como Cristiane Torloni, e escritores, como Augusto Cury, se acotovelavam estrelas do partido como o ministro da Cultura Juca Ferreira e a prefeita de Natal Micarla de Sousa, ex-petistas, como Tilden Santiago, ambientalistas como Fábio Feldmann e Mário Mantovani - fundadores da ONG SOS Mata Atlântica - e até mesmo o líder tucano na Câmara dos Vereadores de São Paulo, Gilberto Natalini.
Durante o ato, que teve a presença também de Elenira Mendes, filha do líder sindical e ecologista Chico Mendes, houve ainda filiação de artistas e do ex-deputado federal petista Luciano Zica, que fará parte da Comissão Nacional que irá coordenar o processo de revisão programática do PV, sob a liderança do presidente nacional da sigla, José Luiz Penna.
Ex-ministro do Meio Ambiente de FHC e atual líder da bancada verde na Câmara Federal, Zequinha Sarney (PV) - filho do senador José Sarney (PMDB-AP) -, disse que Marina "traz para a discussão temas que estão sendo analisados no mundo inteiro e que internamente têm sido 'escanteados'".
Coube ao deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) - que após desfiliação do Partido dos Trabalhadores se aproximou de tucanos ilustres, como o governador de São Paulo, José Serra (PSDB) - o papel de tecer críticas ao governo federal, evitadas até mesmo pela principal personagem do dia. Afinado com o discurso oposicionista, Gabeira levantou a bandeira da ética para desferir seus golpes. "Hoje temos no País um governo moralmente frouxo, temos um Congresso apodrecido e um Supremo Tribunal Federal em princípio de decomposição com a decisão tomada nesta semana", afirmou, referindo-se à absolvição do ex-ministro da Casa Civil, deputado Antônio Palocci (PT-SP).
Gabeira lembrou, no entanto, que o PV apoiou a candidatura Lula em 2002 e disse que seu partido não deve ter receio de ser acusado de utilizar um discurso udenista. "Muita gente fala que falar de ética na política é coisa da UDN", argumentou. "Mas em 2002 apoiamos o PT e foi pela ética na política."
Para terminar, uma mensagem do Ivan Lins, na qual ainda tento - ou teimo em - acreditar.
Créditos: - A senadora Marina Silva participa de debate sobre clima e meio ambiente promovido pelo MST. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil (aqui) - Vídeo: Novo Tempo, Ivan Lins e Vítor Martins. No Youtube (aqui)
Em mais uma jogada pouco divulgada na mídia, o presidente do Senado, José Sarney, jogou no colo dos latifundiários a relatoria da medida provisória 458, que autoriza o governo a transferir, sem licitação, terras da União na Amazônia. Entregar a relatoria do caso à presidente da Confederação Nacional da Agricultura - órgão que reúne os grandes latifundiários brasileiros - a senadora "demo"Kátia Abreu é o mesmo que colocar a raposa para tomar conta do galinheiro.
Com o argumento de regularizar a situação fundiária na região amazônica, a medida prevê que a União pode transferir, sem licitação, terrenos com até 1.500 hectares. Coisa de 15 km². Basta que a terra tenha sido ocupada antes de 1º de dezembro de 2004.
Tudo orquestrado para "regularizar" áreas pertencentes ao Estado - que deveriam receber proteção ambiental pela importância ao ecossistema - invadidas por empresários e latifundiários que querem simplesmente botar a floresta no chão para criar gado e explorar os recursos minerais riquíssimos da região.
Ao assumir a relatoria do caso, a senadora já mostrou a que "interesse público" ela serve. “Eu quero permitir que pessoas que ocupam terras de boa fé, sem litígio, recebam os seus títulos. Depois, se não tiverem a árvore na porta, que sejam multadas. Estamos tratando de regularização fundiária. Não dá para confundir as coisas. As regras ambientais já estão previstas na legislação. Valem para qualquer brasileiro”, afirmou a demo Kátia Abreu.
São sempre dois pesos e duas medidas. Quando o povo ocupa terras devolutas ou áreas onde há brigas judiciais - quase sempre para ressarcimento aos cofres públicos - é invasão. Quando há invasão de empresários em áreas de florestas na região amazônica é ocupação de "boa fé".
A única voz dissonante no plenário em relação à MP e a, consequente, entrega da relatoria do caso aos latifundiários foi a da ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que abandonou o cargo após a nomeação de Mangabeira Unger para coordenar o Programa Amazônia Sustentável. Mangabeira, ex-funcionário do corruptor condenado Daniel Dantas, é um dos principais defensores da Medida Provisória. Dantas, por sua vez, é dono da Usina Santa Bárbara que invadiu áreas da União no Pará, onde capangas armados defendem as terras surrupiadas pelo banqueiro contra qualquer tipo de invasor.
Porém, quem é povo, ama e respeita a floresta, sabe das forças da natureza. E, como Paulo César Pinheiro e João Nogueira (que interpreta a música no vídeo abaixo), também acreditam que "quando o sol se derramar em toda sua essência, as pragas e as ervas daninhas, as armas e os homens de mal vão desaparecer nas cinzas de um carnaval". Salve Oxum!
Créditos: - Capangas de Daniel Dantas abrem fogo contra integrantes do MST no Pará/Reprodução TV Globo (leia aqui a versão da Globo e aqui a versão do MST e do repórter da Globo, que desmentiu a própria empresa em depoimento à polícia) - João Nogueira e Paulo Cesar Pinheiro, em montagem na página de Moisés da Rocha, da rádio USP, onde tem um lindo especial sobre a dupla de compositores - Vídeo: João Nogueira, canta "As forças da natureza", ao vivo no Pelourinho em 1996. No Youtube.
O temor da potencial nova derrota nas eleições presidenciais de 2010 tem feito tucanos e demos se bicarem cada dia mais no ninho oposicionista.
Acostumados a serem sempre da Casa-Grande, os representantes da elite corrupta não sabem dançar no terreiro da oposição, mesmo com as "atravessadas no samba" dos que hoje comandam o engenho.
Mesmo quando tentam criar uma nova crise - depois da marolinha, do dossiê da "dona" dilma e dos grampos -, as trapalhadas da dobradinha do "quanto pior, melhor" acabam botando mais lenha em seu próprio ninho.
O "fair-play" (existe isso em política???) às avessas dos tucanos, ao tentar implantar a CPI da Petrobras fez arrepiar penas no viveiro demo. Investigar as supostas irregularidades - já, devidamente investigadas pelos órgãos competentes, como a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União - nas obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, reacenderia a chama no já abafado suposto esquema de doações ilegais da Camargo Corrêa para políticos da própria oposição, como Heráclito Fortes, que empregava até bem pouco tempo Luciana Cardoso, filha de FHC.
Isso sem contar no que vem acontecendo no Rio Grande do Sul, onde as penas estão voando pelos pampas. Desde o início do governo de Yeda Crusius, os "aliados" demos colocam um graveto por dia na fogueira que está depenando a governadora tucana.
O primeiro a botar lenha foi o ex-vice Paulo Feijó, expulso do DEM depois de ter vazado gravações que comprovariam atos de corrupção e financiamento ilegal da campanha da governadora do Estado. Por muito menos, o clã Sarney cassou a vitória do pedetista Jackson Lago nas urnas no outro extemo do país.
A revista Veja - notória representande da oligarquia tucana paulista, que tem uma aproximação bem mais do que "ética" com a cúpula Demo -, há duas semanas, está jogando álcool na fogueira onde Yeda queima. Tudo bem aos moldes do que foi feito antes da campanha presidencial de 2002, quando a tropa de choque serrista - comandada pelo então delegado federal Marcelo Itagiba - tratou de levar às cinzas a pretensa candidatura de Rosena Sarney.
O duelo sempre foi uma coisa presente na política e na cultura brasileira. Que digam Noel Rosa e Wilson Batista, que se bicaram nos idos dos anos 30 em defesa do território boêmio das noites cariocas.
Os motivos, no entanto, eram muito mais nobres. E os propósitos também. Tanto, que apenas um saiu ganhando nesta briga de bamba: a cultura popular e, consequentemente, o povo brasileiro.
Do duelo, e da amizade, nasceram composições que, de forma simples, revelam ao povo brasileiro as artimanhas do mundo do poder e da política brasileira. Pois, como diria Wilson Batista, se "em terra de cego, quem tem um olho é rei", o povo indaga, a la Noel Rosa: "onde está a honestidade?" (abaixo interpretada por Rubinho Jacobina, na maravilhosa Orquestra Imperial).
Créditos: - Capa do disco "Roberto Paiva & Francisco Egydio - Polemica Wilson Batista x Noel Rosa", de 1956, disponível para baixar no Loronix. - Wilson Batista, no site de música do Uol. - Noel Rosa, no blog Hoje na História, do Jornal do Brasil, em reportagem que fala da morte do compositor em 1937. - Vídeo da Orquestra Imperial na homenagem ao Noel Rosa, feita no Som Brasil, disponível no Youtube.
No dia 14 chegou às bancas mais uma edição da revista Caros Amigos. Desta vez com uma reportagem que eu produzi. Fiquei muito feliz em ver a reportagem na revista cujo editor, o eterno Sérgio de Souza, em poucas - e boas - conversas me ensinou muito sobre o jornalismo e, principalmente, sobre o anti-jornalismo, que muito se pratica.
Sergião sempre prezou o objetivo social do jornalismo - um jornalismo de transformação -, em lugar do jornalismo de interesses, muito comum nas grandes redações nos dias de hoje. Na reportagem (vai um aperitivo aí embaixo) falo um pouco sobre o conluio entre mídia e a politicalha que se faz no Brasil em favor dos endinheirados. A operação abafa sobre as investigações envolvendo a Camargo Correa foi mais um triste episódio do jornalismo de rapina que assola o país.
Seu grande mal (o da mídia gorda) é, justamente, se colocar como independente, imparcial e porta-voz da opinião pública. Pensa que o povo não entende nada sobre aquilo que os oprime e por isto se torna refém das palavras pinçadas pelos "intelectuais" que defendem o status-quo nas TVs e jornalões.
Se esquece que caráter e noção do que é certo e errado não se aprende na escola. Vem de berço. E que, mesmo em uma linguagem que poupa as "excelências" num bate-boca, o povo sabe que há "uma lei severa para o trabalhador e outra de colher de chá e de caô-Caô", como diria o poeta do morro Bezerra da Silva - no vídeo abaixo, uma parte do documentário "Onde a Coruja Dorme".
Como a mídia grande abafou o caso da Camargo Corrêa
São Paulo, 25 de março de 2009. No escritório de uma agência de comunicação localizada na Avenida Paulista, a cúpula da Construtora Camargo Corrêa se reúne com assessores para definir estratégias para abafar mais um escândalo da série em que a empreiteira se envolveu desde quando foi criada, em 1939. Horas antes, ainda durante a alvorada, a Polícia Federal havia desencadeado a operação Castelo de Areia que levou à prisão quatro executivos e duas secretárias da construtora, além de quatro doleiros, um deles com trânsito fácil entre empresários e políticos representantes da chamada “elite brasileira”.
A acusação, mais uma vez, é grave. Segundo a Polícia Federal, os diretores da Camargo Corrêa são acusados de fazer parte de um grupo criminoso que frauda licitações, superfatura obras públicas e envia os recursos desviados para contas em paraísos fiscais. Durante as investigações, liderada pelo coordenador da área de combate ao crime organizado da Polícia Federal em São Paulo, delegado Alberto Legas, foi descoberto ainda que a quadrilha também pratica a velha tática de oferecer vultosas quantias a políticos e membros do poder público em troca de benefícios durante os processos licitatórios.
A reunião é tensa. Entre olhares desconfiados, mordidas nos lábios e expressões pouco amigáveis, um dos executivos da construtora revela que a investigação pode levar à Polícia Federal a mares nunca antes navegados no submundo da corrupção no Brasil. “O problema é que esta é apenas a ponta do iceberg”, bradou aos colegas.
(Leia a reportagem na íntegra na edição 146, de maio de 2009, da revista Caros Amigos)
Imagens: - Capa do álbum "Meu Bom Juiz", de Bezerra da Silva, à venda no Submarino. - Charge de Angeli, reproduzida no blog do Joildo dos Santos. - Trailer do documentário "Onde a Coruja Dorme", no Youtube.
É bonito ver o povo na rua. É a verdadeira sensação de participação democrática, mesmo depois que afastaram de nós a capital, fazendo - lá... bem longe... - a ilha da fantasia dos corruptores do país.
Vendo as velas acesas nesta quarta-feira (6) em frente ao Supremo Tribunal Federal (aqui, via Agência Brasil), lembrei-me de Zé Ketti e seu "acender as velas, já é profissão...".
Cantava o outro lado da moeda, dos que são usurpados por aqueles que, encantados com o poder, pensam ser mais que humano. Se colocam como instituição para defender interesses dos usurpadores da nação.
Salve, Zé Ketti! Salve o povo brasileiro! Acendei as velas!
Acender as Velas Composição: Zé Kéti
Acender as velas Já é profissão Quando não tem samba Tem desilusão É mais um coração Que deixa de bater Um anjo vai pro céu Deus me perdoe Mas vou dizer O doutor chegou tarde demais Porque no morro Não tem automóvel pra subir Não tem telefone pra chamar E não tem beleza pra se ver E a gente morre sem querer morrer
Imagens: - Zé Ketti no blog Leva Meu Samba - Movimentos sociais fazem manifestação em frente ao Supremo Tribunal Federal pedindo a saída do presidente, Gilmar Mendes. Crédito: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Não... Não pense que vou falar do "cara" - que já foi muito bem colocado no artigo do escritor e jornalista Marcelo Carneiro da Cunha (leia aqui). O assunto é mesmo "a" cara do Brasil.
Tenho percebido, já há algum tempo, que o brasileiro tem deixado de ser metido à besta e incorporado, a cada dia, o orgulho de fazer parte de seu povo. Digo "povo" e não esta elite alienada, insípida e inodora que nos rouba ou ajuda a nos roubarem.
Claro, que ainda nos deparamos com tipos de mau gosto se esvaindo em risos de piadas estúpidas, preconceituosas e, sobretudo, de mau gosto. Por não ter atributos físicos que me identifiquem com a grande parte do povo brasileiro, sou sempre sujeito a piadas, quando me identifico como um corinthiano fanático, do tipo: "Mas você tem todos os dentes da boca!?!".
Sempre tenho vontade de sentar com esta pessoa na mesa de boteko e explicar a ela os anos e anos em que ela foi submetida a informações - e até uma educação - preconceituosa e que repassa aquilo sem pensar no que diz. Ah! Se ela soubesse um pouco de Gilberto Freire, de Pixinguinha, de Milton Santos (o geógrafo e o jogador...), de Zumbi dos Palmares. Ela teria tanto orgulho de ser parte desta nação.
Mas sempre acabo deixando um sorriso amarelo, para não me envolver em debates desnecessários. Muitas pessoas se parecem com aquilo que elas gostariam de ser. De estar sempre almejando aquilo que vê na TV ou nas revistas de aluguel. De aparência. E não de emoções.
O povo brasileiro vive aquilo que ele é. Ser. Não ter. Ele acorda cedo, ainda de madrugada, para recolher o seu lixo, aparar o seu jardim, fazer o pão do seu café da manhã, consertar o pneu furado do seu carro, cuidar da portaria do seu prédio. Ou te assaltar em qualquer esquina. Se é isto o que nós, como sociedade, o demos como opção. Com dente ou sem dente, ele estará lá. Vivendo seu dia-a-dia. Balançando nos circulares. Comendo "prato-feito" naquele restaurante simples. Batucando na mesa e cantando o hino do seu "CURINTIA" em ritmo de samba naquele boteko copo sujo. Vivendo e sendo feliz. Sem almejar ser o que não é.
Esta, para mim, é a cara do Brasil. Traduzida no rosto de milhares de corintianos, que é povo no seu dia-a-dia e que se torna um rei no Pacaembu. E foi como povo desse rei, que o fenômeno no mundo encontrou a felicidade em seu país. Ronaldo, o maior do planeta por duas vezes e envolto em tantos casos controveros, nasceu no subúrbio carioca, passou por dificuldades financeiras quando criança, frequentou escola pública, jogava bola descalço na rua. E era feliz. Virou fenônemo e conquistou fama, ganhou dinheiro, viveu na Europa, conheceu a elite mundial. Mas só voltou a ser feliz quando voltou a ser povo em seu país.
Apesar de não ter o dinheiro que ele tem e vivido o que ele viveu, eu, realmente, não faço parte do povo brasileiro pela aparência ou pela condição financeira. Talvez viva melhor - materialmente falando - do que mais de 90% dos que fazem parte dele. Eu faço parte deste povo porque eu me sinto parte de um bando de loucos. Que trabalha honestamente. Que respeita a cultura e os gênios que este país gerou. Que batuca no boteco copo sujo e enche a cara de cachaça. Que tem orgulho de amar e acreditar que este país é o país. E que tem orgulho de ser a cara dele.